terça-feira, 8 de maio de 2012

Break my arms around the one i love

the national | daughters of the soho riots


Costumava gostar da chuva. Fria, violenta e torrencial. Do mar bravo a bater nas rochas desprotegidas. Das janelas abertas, de todas as luzes apagadas e do barulho do vento a perpassar as cortinas do quarto escuro. Das horas longas a atravessar as noites mal dormidas e do cansaço a vencer todos os impedimentos. Dos violinos melancólicos e da poesia mais triste e dolorosa. Lembro-me de suspirar com as histórias de amor contadas nos livros para as esquecer sem demora. A felicidade não se escreve, pensava eu. Eu que sempre li para dentro, com a voz miudinha, e me acostumei à solidão dos dias vazios preenchidos somente por viagens interiores. Eu costumava gostar do silêncio, a sério. Mas isso foi antes de te conhecer. Hoje sinto-me cansada dos invernos que vivi, que não revelei a ninguém. Sinto falta do sol, dos dias compridos que ainda não chegaram, das noites quentes e intermináveis, dos filmes tão certeiros, tão intensamente reais, tão nossos de tão verdadeiros. Agora deixo-me derreter no teu abraço, dou gargalhadas a cada cinco segundos, até acho que sou engraçada, vê lá. Finjo escusadamente que não estremeço quando sinto o teu toque na minha perna, não posso sequer denunciar que me belisco a cada instante para ter a certeza que tu és verdade. Faz de conta que não sou um desastre na cozinha, que o meu problema de expressão é coisa passageira e que já amanhã vou conseguir dizer que te amo com a maior espontaneidade do mundo, com todas as letras, sem tremer por dentro. Como se eu não tivesse sido imperfeita a vida toda, toda a vida. Porque continuo sem saber o que fazer das palavras que me querem nascer na boca, ou o que fazer das mãos que não sabem como alcançar-te. Continuo a gostar de insónias porque agora tenho a sorte de poder ver-te dormir. Sei que posso adormecer tranquila. Fecho os olhos e consigo imaginar os teus, tão claros, de sonhador a alumiar a escuridão. Mesmo nestas noites de primavera zangada. Depois sorrio sem qualquer razão que me valha. Com as minhas mãos a acariciar-te o rosto. Nesses momentos rezo para que, pelo menos assim, consigas adivinhar o muito amor que te tenho. E fazer de conta que nunca fui triste.


5 comentários:

maria joão moreira disse...

um dos textos mais bonitos que tenho lido nos últimos tempos... gostei muito. e adoro a forma como este teu blog nos seduz a entrar e ficar!

Vanessa disse...

ohhh, obrigada... :) *

ana disse...

não vejo nenhum problema de expressão, muito pelo contrário...:)
bj*

Vanessa disse...

:p

je suis...noir disse...

Ainda não tinha parado por aqui, apenas passado ao de leve...
Um diário destes não magoa, mas quebra(nos).